As autoridades brasileiras
descobriram da pior maneira que uma guerra cibernética é travada
silenciosamente todos os dias no mundo. Bilhões de ataques virtuais contra empresas,
pessoas, órgãos públicos e nações ocorrem 24 horas por dia. Com o avanço da
tecnologia, que permite uma comunicação rápida e eleva a atividade humana no
meio virtual, surgem também grandes problemas e situações que exigem ações
complexas para ser resolvidas.
Uma série de invasões aos
celulares de procuradores da Lava-Jato, do ministro da Justiça, Sérgio Moro, de
jornalistas, ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e parlamentares é
apenas uma amostra dos estragos que podem ser causados por ações hostis com o
uso da internet.
Especialistas apontam que o
Estado brasileiro colhe agora o resultado de décadas de atraso no investimento
em segurança da informação e em tecnologias para coibir a ação de hackers e
crimes cibernéticos.
Assim como o resto do mundo, o
Brasil entrou na era em que a privacidade é reduzida à força, e exige mudança
no comportamento de autoridades, executivos, famosos e profissionais que em
apenas um minuto podem se tornar o alvo de investidas de grupos
mal-intencionados.
As mudanças apontadas para
mitigar danos causados pela exposição, sequestro de dados e destruição de
arquivos vão desde alterações nas rotinas pessoais até a restrição de assuntos
que são tratados por meio de aplicativos de mensagens ou correio eletrônico.
Além de pessoas, órgãos públicos inteiros, tribunais e serviços de comunicação,
até mesmo o sistema energético pode ser alvo de danos em decorrência da ação de
crackers, como são chamados os criminosos virtuais.
O livro Guerra cibernética: a
próxima ameaça à segurança e o que fazer a respeito aponta um cenário ainda
distante da atual realidade brasileira, mas deixa o alerta sobre até onde pode
chegar uma investida criminosa pelos sistemas de internet. Até mesmo governos
podem ser autores de práticas reprováveis e até terroristas para gerar
prejuízos para um alvo.
No caso dos procuradores,
pelos relatos que foram informados até agora para a Polícia Federal e à
imprensa, ocorreu um misto de despreocupação excessiva e ausência de instrução.
Uma simples ferramenta, usada no próprio aplicativo Telegram, por onde supostamente
ocorreram os vazamentos, impediria o acesso ao conteúdo privado. A verificação
em duas etapas pode ser ativada nas configurações do aplicativo, e impede que o
conteúdo seja acessado sem que ocorra acesso ao celular do usuário.
A tendência é que esses
ataques se repitam em todas as esferas do poder, e se tornem cada vez mais
sofisticados, criando uma sociedade onde a privacidade é cada vez mais
restrita. O consultor de segurança digital Leonardo Sant’Anna, especialista em
cybercrime, afirma que os desafios de segurança digital avançam em um ritmo bem
maior que a reação do governo brasileiro.
“Esses tipos de ataques vão
continuar. É preciso que se tenha a percepção de quem você é. Tem que fazer uma
análise do nível de risco a ser submetido. Quanto maior o nível hierárquico e
os problemas aos quais se está ligado, mais necessária é a busca por uma
segurança de comunicação.”
O especialista alerta que,
mesmo diante dos casos recentes de invasão, o setor público não tem se
adaptado. Para ele, o Estado tem que adquirir produtos que façam o bloqueio de
ferramentas que são colocadas nos celulares. “Imagino que pelos menos o
ministro Sérgio Moro e os procuradores afetados, a partir de agora, não vão
utilizar o celular da maneira como usavam antes. Não acessar uma rede wi-fi que
não conhecem. Não temos essa cultura de segurança no setor público. Nas
empresas privadas já temos”, completa.
Consciência para mudar postura
on-line
Professor e advogado
especializado em direito digital e proteção de dados, Fabricio Mota reforça que
a tecnologia não é infalível e que ela está sujeita a todo tipo de
invulnerabilidade. “Temos de fazer o nosso dever de casa e adotar
comportamentos seguros para evitar falhas. Não conseguimos controlar a
tecnologia e saber de fato se ela é segura. Por isso, é necessário mudar a
nossa postura com relação a ela para que a maior parte da culpa de uma eventual
invasão não seja nossa”, analisa.
Estar consciente do risco,
lembra Mota, é fundamental para que o usuário tenha noção de segurança. O conselho
é válido especialmente para os brasileiros, visto que no ano passado o Brasil
ficou entre os cinco países que mais
gastam tempo usando celular, atrás de Indonésia, Tailândia, China e Coreia do
Sul, segundo relatório da consultoria especializada em dados sobre aplicativos
para dispositivos móveis App Annie.
Vazamentos na Lava-Jato
Assim que os vazamentos dos
procuradores da Lava-Jato vieram à tona, alguns ministros do Supremo Tribunal
Federal (STF) se preocuparam com o acesso não só aos seus celulares pessoais,
mas também aos sistemas da corte. O temor é que ocorra o vazamento de processos
em segredo de Justiça, inclusive alguns temas que são considerados de segurança
nacional. Nos últimos anos, o tribunal tem investido no ambiente virtual para acelerar
o andamento das ações. De acordo com balanço divulgado pelo STF, até agora, 96%
das ações já tramitam por meio eletrônico.
Até mesmo julgamentos são
realizados por meio do chamado plenário virtual, em que os integrantes do
Supremo tomam decisões públicas ou em segredo de Justiça. O presidente da
corte, Dias Toffoli, destaca que o sistema tem sido reforçado, mas que uma
invasão não pode ser descartada. “Qualquer sistema pode ser alvo de um ataque.
Não estamos livres disso. Mas até o momento não se registrou nenhuma investida
contra o tribunal”, disse.
Fonte: Jornal Estado de Minas
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